Planejamento urbano coletivo aprimora o desenvolvimento das periferias
Instrumentos de planejamento local construídos coletivamente contribuem para ampliar o o da população vulnerabilizada aos serviços básicos, melhorando sua qualidade de vida

Por Fabiana Tock
Intervir em territórios periféricos com o intuito de melhorar a infraestrutura é algo fundamental para a diminuição das desigualdades socioespaciais e, por consequência, para a melhoria da qualidade de vida daqueles que ali vivem, gerando o a mais oportunidades.
É fato que, enquanto os centros das cidades metropolitanas geralmente contam com alta ibilidade aos recursos, os habitantes das periferias vivem cada vez mais apartados de uma série de serviços essenciais como saneamento básico, coleta regular de lixo, saúde, lazer, educação e transporte.
Tal constatação fica clara em um levantamento feito em 2020, pelo Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), que mostra que, ao se pensar em ofertas de trabalho, educação e cultura, a região metropolitana de São Paulo é a mais procurada por pessoas de outras cidades, mas também é a mais desigual do país.
Pelo mesmo estudo, na capital paulista, aqueles que moram em regiões com melhor infraestrutura têm nove vezes mais empregos disponíveis a uma distância de 30 minutos de caminhada de onde moram do que os moradores das periferias.
Para solucionar esses problemas, é preciso, entre outras ações, dar mais atenção ao planejamento local, ou seja, aos instrumentos de planejamento urbano que olham para a escala territorial.
Uma vez que a forma como a população se desloca e vive no dia a dia é moldada por dispositivos e normas de planejamento previstas em documentos públicos, esses instrumentos precisam ser construídos de maneira participativa, ouvindo-se e considerando-se as reais demandas dos moradores, a fim de servi-los com infraestrutura urbana, garantindo a equidade e a inclusão dessa população vulnerabilizada aos bens e serviços da cidade.
Outro caminho adequado para melhorar o desenvolvimento nas periferias urbanas é o investimento, por parte de diferentes instituições, nas ideias das várias lideranças locais, por meio de um apoio institucional estruturado e de longo termo, o que confere visibilidade para as soluções e as propostas que surgem ali e que podem pautar o planejamento urbano.
Na região do Jardim Lapena, bairro periférico da zona leste de São Paulo (SP), existe um engajamento dos moradores em busca de melhorias para a localidade, com a presença e a escuta ativa da Fundação Tide Setubal e de outras organizações.
Em 2017, por exemplo, um Plano de Bairro foi produzido coletivamente e consistiu no primeiro plano de bairro participativo da cidade de São Paulo. A iniciativa prevê o que é mais importante para o território, em termos de ampliação da oferta de serviços, equipamentos urbanos e espaços públicos, a partir do olhar dos moradores, que foram apoiados por técnicos de organizações como Fundação Getulio Vargas (FGV) e Universidade Presbiteriana Mackenzie.
A iniciativa inédita culminou em conquistas significativas, como a inserção do bairro no programa de urbanismo social da Prefeitura Municipal de São Paulo e a aplicação da intervenção Rotas Educativas do Plano de Bairro do Jardim Lapena no cronograma de obras da cidade — essa medida visa requalificar as ruas do bairro que interligam os equipamentos sociais e educativos.
Por meio da interação com especialistas, moradores do Lapena também participaram em 2020 de deliberações cidadãs para a tomada de decisão sobre demandas do bairro, com base no orçamento do município.
Sedimentar essa participação conjunta é fundamental, pois ela ajuda a preparar o território para investimentos futuros de maior envergadura ou calibre, que movimentam mais montantes financeiros.
Ter uma governança na comunidade, um grupo mobilizado, sensibilizado e ativo para produzir a mudança do bairro é um fator positivo que associa menos riscos ao investimento na infraestrutura local.
Além disso, instrumentos de planejamento local conseguem organizar e hierarquizar as demandas daquela comunidade, facilitando tanto a chegada do poder público para a implementação de ações que são mais relevantes, quanto a participação de investidores privados nesse espaço que se mostra mais organizado e atrativo aos aportes.
Por fim, ao dar visibilidade para o território, esses instrumentos facilitam o planejamento integrado, potencializando o resultado das intervenções públicas.
Planos locais, além de deixarem um legado social para os moradores, operam como catalizadores das dinâmicas de transformações dos bairros e podem ser traduzidos como uma nova forma de pensar as políticas públicas, por meio do diálogo e da participação de todos.
A tarefa não é simples. É preciso ouvir as lideranças locais, organizar as ideias e conectar os moradores com oportunidades de qualidade, sejam do mundo público ou privado.
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Sobre a autora:
Fabiana Tock é mestre em istração pública e governo pela Fundação Getulio Vargas, pós-graduada em sociologia e investigação social pela University College of Dublin e em gestão pública pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP). Atuou na coordenação de projetos de gestão social no contexto do licenciamento ambiental e de políticas públicas nas temáticas das desigualdades, pobreza, primeira infância, dentre outras. Trabalhou na Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social de São Paulo na gestão da política de enfrentamento da extrema pobreza do estado e da primeira infância. Atualmente, é coordenadora do programa de cidades e desenvolvimento urbano da Fundação Tide Setubal.