Projetos sociais levam eletricidade e bibliotecas para a Amazônia

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Para muitas comunidades da Amazônia, quem leva atendimento médico, eletricidade, bibliotecas e outros serviços básicos são as organizações da sociedade civil (OSCs)

Foto: Litro de Luz Brasil/Divulgação

por Artur Ferreira

Diante do crescimento do número de queimadas na Amazônia, que gerou um grande debate público sobre o desmatamento ilegal, personalidades como o Presidente Jair Bolsonaro e ministros do seu governo questionaram a atuação das ONGs no território da floresta amazônica.

Muitas dessas organizações, no entanto, realizam trabalhos fundamentais para as populações que vivem na região da Amazônia, principalmente as populações mais vulneráveis.

E engana-se quem pensa que as organizações da sociedade civil (OSCs) com atuação nos estados do território amazônico são apenas vinculadas à causa ambiental. A região conta com trabalhos sociais que incluem atendimento médico, o à eletricidade e criação de bibliotecas infantis em comunidades ribeirinhas.

Alguns números sobre a região Norte do Brasil

A região Norte, que concentra a maior parte dos estados da Amazônia Legal, é uma das mais pobres do país. 48,1% de sua população vivia com até meio salário mínimo de renda per capita em 2017, segundo a Síntese dos Indicadores Sociais 2018, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Além disso, na região, 82,3% da população tem restrição a serviços de saneamento básico. As restrições também são altas no o a serviços de comunicação (34,4%), educação (28,4%), proteção social (27,4%) e a condições dignas de moradia (24,4%).

Diante de tantas restrições, que denunciam o abandono do poder público, muitas vezes são as organizações do Terceiro Setor que oferecem o básico para os moradores da região. São também essas entidades que lutam pelos direitos dos diferentes povos que habitam a Amazônia, como os indígenas e quilombolas.

Trabalhos sociais na Amazônia

Dois exemplos de organizações da sociedade civil com atuação na Amazônia e que defendem suas populações são o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), voltado para a defesa dos povos indígenas, e a Operação Sorriso, que realiza correções de lábio leporino e fenda palatina de forma gratuita.

O CIMI conta com 11 unidades distribuídas pelo país, e é composto por voluntários leigos e religiosos, que realizam publicações, jornais, atendimento de cunho teológico e defesa do direito à demarcação de terras indígenas.

A Operação Sorriso é uma organização médica mundial, que promove o atendimento e cirurgias gratuitas para pessoas que nasceram com alguma deformidade facial. Os casos mais comuns atendidos são de lábios leporinos e fenda palatina.

Pamela Lopes, diretora de marketing da Litro de Luz Brasil afirma que existe uma ideia de que, se a organização atua no território da Amazônia, ela está estritamente ligada à pauta ambiental, quando na verdade as possibilidades são bem mais amplas.

A questão dos preconceitos também pera o trabalho da Associação Vaga Lume. De acordo com a educadora Aline Calahani, a Amazônia é um dos “lugares em que as pessoas são menos valorizadas no contexto brasileiro; as pessoas esquecem que toda a floresta é habitada”.

Aline atua na Associação Vaga Lume, que promove a doação de livros e montagem de bibliotecas em comunidades rurais nos nove estados da Amazônia Legal, e em 22 munícipios da região.

A educadora explica que o foco da equipe técnica da Vaga Lume é capacitar profissionais da própria região para mediação de leitura com crianças, principalmente em centros urbanos, para que os profissionais desses locais realizem o mesmo treinamento para voluntários das comunidades.

Foto: Associação Vaga Lume/Divulgação

Além disso, outra preocupação importante é que o material levado até a região e por uma curadoria. Aline ressalta que o objetivo da associação é sempre valorizar a cultura local das comunidades.

Um exemplo dessa valorização da cultura regional é a criação de “livros artesanais”, montados pela Vaga Lume com relatos de contadores de história desses locais, com o objetivo de manter histórias tradicionais da região registradas em livros e com fácil o para as crianças.

“A Amazônia é um lugar rico em pessoas e histórias”, conta Aline. Ela também explica que todas as bibliotecas foram montadas após cada comunidade se mostrar interessada e concordar em participar do projeto de forma voluntária.

Biblioteca construída em Portel, Pará – Foto: Associação Vaga Lume/Divulgação

Aline comenta que uma das vulnerabilidades que mais percebeu em sua atuação com a Amazônia, quando comparando a outras regiões do Brasil, é que as pessoas nas comunidades rurais e afastadas dos centros urbanos regionais não se sentem verdadeiramente brasileiras.

Pensando nisso, a Associação Vaga Lume promove o Projeto Rede, que busca unir crianças e adolescentes do Sudeste e do Norte do país, através de fotos, cartas e relatos, para criar uma troca de culturas e experiências entre esses jovens.

Durante meses, os adolescentes trocam essas cartas e realizam atividades e brincadeiras, de forma que desenvolvem ao longo do tempo uma amizade à distância.

Ao final desse processo, a associação organiza um acampamento de integração que leva dois adolescentes da Amazônia e dois do Sudeste para um encontro em Brasília. “É uma metodologia de intercâmbio cultural”, conta a educadora. É uma forma prática de quebrar estereótipos e mostrar a diversidade cultural do país a crianças e adolescentes.

Outra forma de tornar mais próximas populações afastadas dos grandes centros no território amazônico é a manutenção básica de infraestrutura para essas comunidades que não têm o a recursos como iluminação.

Um exemplo dessa forma de atuação é o trabalho realizado pela Litro de Luz Brasil. De acordo com Pamela, o trabalho da instituição é uma forma de parceria com as comunidades mais afastadas, principalmente ribeirinhas, que não possuem o à energia elétrica.

Foto: Litro de Luz Brasil/Divulgação

Dentre os projetos realizados pela instituição, há a montagem de lampiões com materiais de baixo custo e reaproveitados, e postes à base de energia solar.

Pamela explica que além de haver uma conversa prévia com líderes comunitários e com as famílias dos locais atendidos, a equipe da Litro de Luz ensina os moradores da região a montarem seus próprios lampiões.

A montagem dos equipamentos em conjunto é uma forma de estabelecer um relacionamento com aquela população. “São pessoas muito gentis e acolhedoras, e a exploração [ilegal] danifica esse meio de vida simples nas comunidades”, conta Pamela.

Ela também afirma que nas atividades da organização são muito bem recebidos pelos povos ribeirinhos e conseguem notar o interesse dessas comunidades para que o contato entre eles e a organização não se perca.

Além disso, a Litro de Luz mantém um constante monitoramento das comunidades atendidas, já que é necessário um retorno de tempos em tempos para a manutenção dos equipamentos instalados.

“Ao todo, já impactamos 13 mil pessoas de forma direta”, afirma Pamela. Ela também diz que, embora o projeto não atue estritamente na defesa da pauta ambiental, o tema é tratado constantemente na visita às comunidades.

O que as profissionais do terceiro setor relatam de forma homogênea é o preconceito por parte da sociedade sobre seu trabalho.

Afirmam que existe no imaginário popular um conceito de que as OSCs na Amazônia atuam em um número limitado de pautas, sendo que isso não corresponde à realidade.

Pamela completa dizendo que a luta por viabilizar outras pautas dentro do território amazônico é de suma importância e que “todo mundo deveria ar pelo menos uma semana em uma comunidade ribeirinha”, para entender a realidade dos povos que ocupam esses territórios.


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