Economia Circular: o que é e qual a sua importância para o mundo

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Saiba o que é economia circular, qual sua importância para a sociedade e como ela pode ser desenvolvida no Brasil e no mundo 

Observatório inicia série sobre Economia Circular em programa de rádio
Foto: Adobe Stock | Licenciado

Por: Juliana Lima

Desde os séculos 18 e 19, com a Revolução Industrial, o processo de produção de todo o mundo capitalista tem sido o da economia linear. Nela, as matérias-primas são retiradas da natureza para a produção de bens de consumo, que logo são descartados. Dessa forma, são geradas toneladas de lixo todos os anos. Só no Brasil, são produzidas cerca de 80 milhões de toneladas de lixo por ano, sendo que o país é o quarto maior produtor de lixo plástico do mundo. 

Além disso, outros problemas ambientais e sociais são gerados como consequência do consumo desenfreado – muitas vezes, de itens supérfluos e de forma completamente desigual entre a sociedade – e do descarte inapropriado dos resíduos. A poluição atmosférica já leva 51 mil pessoas à morte, por ano, só no Brasil, e a poluição da água, seu uso irresponsável e as mudanças climáticas fazem com que aumente a preocupação sobre o futuro da água potável no planeta. 

Com o tempo, inúmeros pesquisadores, organizações e outros atores da sociedade chegaram à conclusão de que o modo de vida atual não é mais sustentável e ameaça a própria existência humana no mundo. Como forma de tentar eliminar ou atenuar esses problemas, surge então a economia circular, que propõe uma nova forma de convívio com a natureza. 

O que é a economia circular

A economia circular é um conceito de desenvolvimento econômico que prioriza matérias-primas duráveis, recicláveis e renováveis. Segundo a Fundação Ellen McArthur, uma das grandes referências mundiais na área, a economia circular representa uma dinâmica de produção e consumo baseada em três eixos: 

  • Eliminar resíduos e poluição desde o princípio; 
  • Manter produtos e materiais em uso; 
  • Regenerar sistemas naturais. 

Na prática, significa extrair menos recursos da natureza e usar o que já está em circulação, com a reciclagem, por exemplo. Nessa proposta, um objeto só é de fato descartado quando se esgotaram todas as suas possibilidades de uso e renovação. Para entender esse ciclo, é possível lembrar do conceito dos cinco “R”: reduzir, reutilizar, remanufaturar, reciclar e restaurar. No entanto, a economia circular vai além disso. 

De acordo com a Fundação Ellen McArthur, não se trata apenas de reduzir os impactos imediatos do sistema linear, mas promover uma mudança sistêmica e de longo prazo em toda a cadeia produtiva. 

Do ponto de vista acadêmico, a economia circular agrega diversos conceitos: a economia de performance de Walter Stahel; a filosofia de design Cradle to Cradle (do berço ao berço, em tradução livre) de William McDonough e Michael Braungart; a ideia de biomimética articulada por Janine Benyus; a ecologia industrial de Reid Lifset e Thomas Graedel; o capitalismo natural de Amory e Hunter Lovins e Paul Hawkens; e a abordagem blue economy descrita por Gunter Pauli.

A transição para uma economia circular

Como o próprio nome diz, na economia circular, todas as etapas de produção e consumo estão interligadas. No entanto, é possível começar a entender essa dinâmica a partir do que consideramos atualmente o ponto inicial: a concepção dos produtos. 

A obsolescência programada é uma técnica de mercado que surgiu nos Estados Unidos na década de 1930 com o objetivo de recuperar a economia, então afetada por uma das piores crises da história, a partir do consumo desenfreado. Trata-se de fabricar produtos que tenham um “prazo de validade” muito mais curto do que poderiam a fim de induzir o consumidor a trocar de bens com mais frequência. Um exemplo clássico são os telefones celulares, que surgem em novos modelos a cada pequeno avanço da tecnologia, e ajudam a criar bilhões de toneladas de lixo eletrônico. 

Na economia circular, os produtos são duráveis. Além disso, devem ser feitos a partir de materiais facilmente recicláveis e não tóxicos. Dessa forma, em vez de ter um produto que será descartado rapidamente e contribuirá para o aumento da poluição, você opta por um produto que permanecerá em circulação por mais tempo. Outro ponto fundamental é que as peças dos produtos possam ser desmontadas e reaproveitadas para a fabricação de novos itens. Dessa forma, eliminam-se os resíduos, mas as matérias-primas continuam existindo na quantidade necessária. 

No que diz respeito ao consumidor, é estimulado o consumo consciente, ou seja, o que leva em conta as reais necessidades das pessoas e não só o desejo impulsivo, e o que dá preferência pelos melhores produtos de um ponto de vista socioambiental. Quando um objeto não é mais útil, ele pode ser doado a outra pessoa, pode ser reformado ou reaproveitado por meio do upcycling, como as técnicas que criam novas roupas a partir de peças antigas. A reciclagem entraria em último caso. 

A economia circular no mundo

De acordo com um relatório da organização internacional Circle Economy, divulgado em 2021, apenas 8,6% da economia global é circular. Para ser implantada e funcionar de fato, a economia circular não depende apenas da consciência dos consumidores ou das empresas. A Comissão Europeia, por exemplo, aprovou um plano de transição para uma economia circular em 2015, um dos primeiros sobre o tema. 

Em 2020, a União Europeia ou a adotar o Plano de Ação para a Economia Circular como forma de atingir o objetivo de neutralidade climática até 2050. O plano é voltado tanto para empresas e autoridades públicas como para os consumidores e tem foco em setores cruciais, como plástico, têxteis, eletrônicos e construção. 

Além disso, diversos países da Europa adotaram seus próprios planos para implantar a economia circular. A Holanda, que é uma referência no assunto, tem um plano desde 2016 para tornar toda a sua economia 100% circular até 2050. Para isso, o governo holandês definiu cinco intervenções principais: 

  • Criação de leis e regulações que estimulem a inovação e apoiem novos investimentos sustentáveis; 
  • Incentivos a mercados inteligentes, com maior uso de materiais reciclados e renováveis; 
  • Apoio a modelos de negócios circulares;  
  • Disseminar conhecimento sobre economia circular e inovação; 
  • Criar condições e mercados para interação global segundo uma economia circular. 

Para realizar a transição, foi preciso encarar o fato de que alguns setores econômicos, como o de matérias-primas primárias e materiais de descarte (aqueles que não podem ser reciclados) irão, de fato, desaparecer. No entanto, a Holanda estima que haverá uma redução de até 9% nas emissões de CO2 no país, além de um crescimento no PIB (Produto Interno Bruto) que varia de 1,5 bilhão de euros em um cenário pré-economia circular para um PIB adicional de 8,4 bilhões de euros. 

Já na União Europeia, estima-se que até 2030 a implementação de uma economia circular gere ganhos de até 0,5% no PIB e mais de 700 mil novos postos de trabalho. Além disso, segundo a Comissão Europeia, os ganhos serão maiores para o bloco europeu se a transição para uma economia circular ocorrer a nível mundial. É nesse sentido que surgem iniciativas como a Coalizão de Economia Circular para a América Latina e Caribe, que serve como uma plataforma de troca de experiências sobre as melhores práticas na área. 

A economia circular no Brasil

O Brasil demorou para embarcar no debate sobre economia circular se comparado aos países europeus ou mesmo da América. Dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI) de 2019 apontam que 76,5% das indústrias brasileiras já desenvolvem alguma iniciativa da economia circular, mas a maioria não sabe que as práticas se enquadram no conceito e desconhecem até mesmo o termo economia circular. 

Segundo Moisés Weber, e psicoterapeuta com pós-graduação em gestão de empresas pela Faculdade Getulio Vargas (FGV) e diretor da Plastiweber Circular, existe uma complexidade na economia circular com a qual o Brasil ainda não conseguiu se adaptar. 

“A economia circular não se trata apenas de pequenas ações isoladas. Para ser um agente da economia circular, por exemplo, não se pode só reciclar, precisa também estimular uma cadeia de materiais recicláveis, fazer trabalho com cooperativas, estimular projetos de educação, promover um design reciclável, em diante”, disse o especialista em entrevista ao Observatório do Terceiro Setor no programa de rádio Brasil Cidadão. 

Enquanto inúmeras empresas brasileiras já se esforçam para criar modelos circulares e expandir o conhecimento da população sobre o tema, especialistas dizem que há necessidade de incluir o poder público no debate. Em abril de 2021, por exemplo, a prefeitura da cidade de São Paulo ou a integrar a rede da Fundação Ellen McArthur com o objetivo de consolidar um plano municipal de economia circular e se tornar um centro de referência para grandes cidades da América Latina. 


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