Caso de menina deu origem ao Dia de combate ao abuso de crianças e adolescentes
Araceli Cabrera Crespo, com 8 anos na época, em 18 maio de 1973, foi raptada, drogada, estuprada, morta e carbonizada no Espírito Santo; os culpados pelo crime nunca foram presos e o crime ficou impune. Desde 2020, data foi instituída como o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes.

Araceli Cabrera Crespo, com 8 anos na época, em 18 maio de 1973, foi raptada, drogada, estuprada, morta e carbonizada no Espírito Santo. O corpo foi deixado desfigurado e em avançado estado de decomposição próximo a uma mata, em Vitória, dias depois de desaparecer. Depois de alguns anos, o dia do desaparecimento de Araceli ou a servir de marco para alertar a sociedade sobre a violência contra as crianças. O 18 de maio foi instituído como o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, desde o ano 2000.
Os principais suspeitos, Paulo Constanteen Helal e Dante Michelini, pertencentes a famílias influentes do Espírito Santo, foram condenados pelo crime em 1980. No entanto, em novo julgamento, em 1991, os réus foram absolvidos após extensivo reexame do processo.
Em 18 de maio de 1973, a ausência de Araceli foi notada pelo pai quando a menina não voltou para casa depois da escola, o Colégio São Pedro, na Rua General Câmara, no bairro da Praia do Suá, em Vitória. Pensando se tratar de um sequestro, distribuiu fotografias da filha aos jornais locais.
O corpo da menina Araceli foi encontrado 6 dias depois, nos fundos do Hospital Infantil de Vitória (Hospital Jesus Menino). Uma das hipóteses foi de que a menina teria sido mandada pela mãe para entregar um envelope a Jorge Michelini, tio de Dantinho, um dos suspeitos de sua morte. Chegando lá, os acusados a teriam drogado, estuprado e assassinado num apartamento do Edifício Apolo, no centro de Vitória. Porém, de acordo com a promotoria (e depoimento de Marislei Fernandes Muniz), Araceli esperava o ônibus depois da escola, quando Paulo Helal, que estava em seu Ford Mustang branco, pediu para Marislei dizer à menina que “Tio Paulinho” a chamava para levá-la para casa.
Foi comprovado que a menina foi mantida em cárcere privado por 2 dias, no porão e no terraço do Bar Franciscano, que pertencia à família Michelini. Tudo sendo do conhecimento de Dante Michelini, pai de um dos acusados. Os rapazes, sob efeito de barbitúricos, teriam lacerado a dentadas os seios, parte da barriga e a vagina da menina. A menina foi levada agonizante ao Hospital Infantil, mas não resistiu. Os acusados ainda permaneceram com o corpo; mantiveram-no sob refrigeração e jogaram-lhe um ácido corrosivo para dificultar a identificação do cadáver. Em seguida, jogaram os restos mortais da menina num terreno próximo ao mesmo Hospital Infantil.
Os suspeitos do crime pertenciam a duas famílias influentes do Espírito Santo. Os nomes dos envolvidos no caso eram Paulo Constanteen Helal, conhecido como Paulinho, e Dante Michelini Júnior, conhecido como Dantinho. Este último era filho do latifundiário Dante Michelini, influente junto ao regime militar, enquanto Paulinho era filho de Constanteen Helal, de família igualmente poderosa. Eles eram conhecidos na cidade como usuários de drogas que violentavam garotas menores de idade. O bando teria sido responsável também pela morte de um guarda de trânsito que os havia parado. Ambos foram citados nos artigos 235 e 249 do Código Penal. Também foi apontada como suspeita a própria mãe de Araceli, Lola Sánchez, que teria usado a própria filha como “mula” para entregar drogas a Jorge Michelini. Lola seria um contato na rota Brasil–Bolívia do tráfico de cocaína, e desapareceu de Vitória em 1981 residindo atualmente em seu país de origem. O pai de Araceli, Gabriel Crespo, faleceu em 2004.
Apesar de Paulo e Dantinho serem os principais suspeitos, e de haver testemunhas contra eles, jamais foram condenados pela morte da Araceli. De acordo com o relato de José Louzeiro, autor do livro “Araceli, Meu Amor”, o caso produziu 14 mortes, desde possíveis testemunhas, até pessoas interessadas em desvendar o crime. Ele próprio, enquanto investigava o crime em Vitória para produzir seu livro-reportagem, teria sido alvo de uma tentativa de “queima de arquivo”.
O romance reportagem “Aracelli, Meu Amor”, de 1976, de autoria do escritor e jornalista José Louzeiro, foi censurado durante a ditadura militar a pedido dos advogados dos acusados.
A ideia de celebrar o Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes surgiu em 1998, quando cerca de 80 entidades públicas e privadas reuniram-se na Bahia para o 1º Encontro do EAT no Brasil. O EAT é uma organização internacional que luta pelo fim da exploração sexual e comercial de crianças e adolescentes, surgida na Tailândia. A então deputada federal capixaba Rita Camata, atuando como presidente da Frente Parlamentar pela Criança e Adolescente da Câmara dos Deputados, propôs um projeto de lei estabelecendo o dia da morte de Araceli como Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. O projeto virou a Lei N° 9.970, sancionada em 17 de maio de 2000 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. Desde então, entidades que atuam em defesa dos direitos de crianças e adolescentes promovem atividades em todo o país para conscientizar a sociedade e as autoridades sobre a gravidade dos crimes de violência sexual cometidos contra menores.