Brasil criou 1ª lei antirracista após hotel negar hospedar dançarina negra

Direitos Humanos
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A dançarina e coreógrafa americana Katherine Dunham fazia turnê pelo Brasil  em 1950, quando foi proibida de se hospedar no hotel Esplanada por ser negra

Katherine Dunham. Crédito: Marcus Blechman/ Museum of the City of New York

A dançarina e coreógrafa americana Katherine Dunham fazia turnê pelo Brasil  em 1950. Na noite de 11 de julho daquele ano, uma terça-feira, em sua estreia no Theatro Municipal de São Paulo, ela aproveitou o intervalo entre o primeiro e o segundo ato para fazer uma denúncia aos repórteres que cobriam o espetáculo. Revoltada, a artista relatou que, dias antes, o gerente do Esplanada, o luxuoso hotel vizinho do teatro, recusara-se a hospedá-la ao descobrir que era uma “mulher de cor”.

Além de especializada em danças de origem africana, Dunham era antropóloga e ativista social nos Estados Unidos. A denúncia de racismo caiu no país como uma bomba. Primeiro, por ter partido de uma estrela de renome internacional. Depois, porque o Brasil se julgava o mais perfeito exemplar de democracia racial mesmo sendo um dos últimos países a abolir a escravidão, tendo feito isso somente em 1888. O Correio Paulistano classificou o episódio de “revoltante incidente”. O Jornal de Notícias, de “odioso procedimento de discriminação”.

O deputado federal Afonso Arinos (UDN-MG) apresentou à Câmara dos Deputados um projeto de lei para transformar determinadas atitudes racistas em contravenção penal. Pela proposta, quem recusasse hospedagem em hotel, entrada em estabelecimento comercial, matrícula em escola ou contratação em empresa pública ou privada, desde que “por preconceito de raça ou de cor”, poderia ser condenado a pagar multa e cumprir até um ano de prisão.

A aprovação na Câmara e no Senado foi por unanimidade. Em 3 de julho de 1951, um ano depois do “revoltante incidente” no Hotel Esplanada, o texto aprovado ganhou a do presidente Getúlio Vargas e entrou em vigor com o apelido de Lei Afonso Arinos.

A Lei Afonso Arinos surgiu como a primeira norma destinada a punir e inibir atos racistas. Mas os negros no Brasil continuavam sendo vítimas de preconceito e ocupando as posições mais baixas da sociedade sem que o poder público se preocue com isso.

Pesquisas acadêmicas recentes desfazem a aparente contradição entre o perfil de Afonso Arinos e o conteúdo de sua lei. De acordo com os estudos, o objetivo central da norma não era exatamente proteger as pessoas de atos racistas, mas sim desmontar o crescente movimento negro e impedir a explosão de conflitos raciais no Brasil na época. A lei, portanto, beneficiaria os brancos, não os negros.

Fonte: El País

 


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