A relevância de instituições sociais pensarem em mensurar seus dados (KPIs) e implementar ações de impacto

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Foto: Adobe Stock | Licenciado

Por Edmond Sakai 

As instituições sociais, ou qualquer empresa do terceiro setor, devem ser istradas como se fossem uma companhia do segundo setor. A principal diferença quanto ao objetivo é que as empresas buscam o lucro; as organizações da sociedade civil cumprem com a missão. No entanto, isto não significa que as ONGs não almejem o lucro. Elas vão sim a sua procura, mas não é para reparti-lo com os acionistas. É para implementar mais e melhores ações para satisfazer a razão pela qual foram criadas e, por conseguinte, causar impactos positivos em nossa sociedade.

Assim, todas as boas práticas gerenciais do segundo setor como gestão financeira, análise de mercado, posicionamento de marca e atendimento ao cliente são aplicadas no terceiro setor. De fato, atualmente diversas ONGs utilizam estas técnicas para proteger eficientemente crianças vulneráveis, meio-ambiente, saúde e minorias. Dentro deste contexto, os KPIs (indicadores chaves de desempenho) são uma das ferramentas primordiais para uma boa istração.

A literatura não é pacífica quanto ao surgimento dos KPIs, mas encontramos (Coens & Jenkins, 2000) esta prática já no século III quando os imperadores chineses da Dinastia Wei, anos 221 a 265, avaliavam a performance da família imperial.

No século ado, de um lado, Peter Drucker popularizou o conceito de KPIs quando disse que “you can´t manage what you can´t measure” (“não se pode gerenciar o que não se pode medir”). De outro, Igor Ansoff defendeu cautela na mania de querer mensurar tudo ao extremo, cujo efeito chamava de “fenômeno da paralisia por análise”. Em outras palavras, indicadores são essenciais, mas o seu uso excessivo freia as ações. Esta é a tônica largamente usada pelas empresas – seja de qual setor forem – que empregam este mecanismo para avaliar se as metas estão sendo atingidas com o fim de alcançarem seus objetivos.

No universo das organizações sociais, reconhecido por oito em cada dez brasileiros como um importante ator que positivamente impacta a sociedade (Brasil Giving Report 2020), esta mensuração dos dados via KPIs permite medir o desempenho dos diversos departamentos com resultados que são “quantitativos-abstratos”. Isso é ótimo, mas não é tudo. Por quê?

Porque este resultado pode ser um mero número que parece resolver um problema. Contudo, é insuficiente para avaliar o real impacto da ação. Por exemplo: uma ONG implementou um projeto por um ano na cidade de São Paulo para fazer com que jovens vulneráveis de 18 a 24 anos tornem-se autossuficientes em termos financeiros por meio de capacitação profissional. No final do ano, 1000 jovens conseguiram empregos. É um resultado importante, mas analisado solitariamente é apenas um número. Se quisermos avaliar o impacto do projeto naquela localidade, alguns questionamentos devem ser feitos:

  • Dessas pessoas vulneráveis que conseguiram emprego, qual é a porcentagem atribuída exclusivamente a essa ONG na mitigação do desemprego (de jovens de 18-24 anos) na cidade? E no estado? E no País?
  • Qual é o emprego que esses jovens vulneráveis conseguiram e por quanto tempo se mantêm (ou mantiveram) nele?
  • Os empregos destes jovens vulneráveis conseguem ajudar a aumentar o PIB da cidade em qual porcentagem? E do País?
  • Estes empregos ajudam a manter quantas pessoas nos lares destes jovens vulneráveis?
  • O que a ONG está fazendo com aqueles jovens vulneráveis que não conseguiram emprego?

A partir destas respostas poderemos avaliar o real impacto social – efeito em cascata que transforma a vida de pessoas e de comunidades seja por ação, seja por inação (um conceito entre muitos) – que tais organizações estão fazendo em nosso País. Como corolário, este impacto é o que vai determinar cada vez mais quais ONGs conseguirão novas parcerias com empresas, porque estes procuram entidades que entregam resultados “qualitativos-particulares”, isto é, números que resolvem os problemas de uma comunidade transformando em cascata a vida de seus cidadãos. E para se chegar a estes resultados, organizações precisam fazer estudos de impactos sociais de seus projetos.

Mesmo no pós-pandemia, acredita-se que as empresas transnacionais e multinacionais – talvez um pouco mais tímidas no começo – continuem a investir em causas que entregam impactos sociais, porquanto sabem que os consumidores, em qualquer cidade do mundo, exigem que as mesmas tenham um papel ativo na sociedade. Com efeito, aqui no País, a análise do Brasil Giving Report 2020 confirma este entendimento:

“Os brasileiros acham que as empresas têm um papel importante a desempenhar nas comunidades: 86% concordam que as empresas brasileiras devem apoiar as comunidades locais e 83% acham que as empresas internacionais devem apoiar as comunidades em que atuam.”

Em suma, considerando tudo o que foi exposto, a mensuração de dados (KPIs) e a entrega de impactos sociais comprovados são ferramentas que se complementam e serão cada vez mais exigidos de todos os players do terceiro setor. E as empresas, como investidoras sociais, são grandes aliadas na construção de um mundo mais justo.

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Sobre o autor:

Edmond Sakai é diretor regional da Sede Mundial da ONG internacional médica Operation Smile. É advogado e professor universitário. É mestre em Integração da América Latina pela Universidade de São Paulo e mestre em istração de ONGs pela Washington University in St. Louis, EUA. Foi professor de Direito Internacional na UNESP, professor de Gestão do Terceiro Setor na FGV-SP e Representante da Junior Chamber International na ONU. Recebeu Voto de Júbilo da Câmara Municipal de São Paulo.


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