A onda anti-woke e o ciclo da transformação cultural

Direitos Humanos
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Por Alain S. Levi 

 

O debate sobre a “onda anti-woke” e suas implicações na transformação cultural não pode ser analisado de forma isolada, mas sim dentro de um ciclo social recorrente. Tenho defendido que como ocorre em todo grande avanço da humanidade, as movimentações culturais seguem um fluxo que a por quatro estágios distintos: Ignition (ignição), Compensation (compensação), Denial (negação) e Consolidation (consolidação). O atual cenário reflete precisamente o estágio da negação que antecede a grande transformação.

Nos últimos anos, o chamado movimento woke emergiu como um catalisador de mudanças, desafiando estruturas tradicionais e trazendo à tona debates urgentes sobre diversidade, inclusão e justiça social. Esse foi o momento de ignição, em que novas ideias ganharam força, impulsionadas pelo entusiasmo e pela necessidade de corrigir injustiças históricas. Em seguida, a compensação se manifestou na adoção de políticas públicas e empresariais mais inclusivas, no redesenho de narrativas midiáticas e na reavaliação de práticas culturais. Trata-se de um período de ajustes rápidos, muitas vezes reativos, em que instituições e indivíduos buscavam se alinhar ao novo contexto.

No entanto, toda transformação significativa gera resistência como a que temos vivido. A fase de negação é marcada por um contramovimento que questiona excessos e reavalia o impacto das mudanças. O movimento anti-woke surge como uma recalibragem da realidade. Uma reação dos conservadores aos padrões sociais  de agendas progressistas vistos como preconceito reverso e anti meritocráticos. O momento atual reflete exatamente essa transição, onde o foco está em equilibrar diversidade, inclusão e pragmatismo. A questão não é se o movimento woke está perdendo sua força, ou se o mundo está vivendo um retrocesso, mas como todas as conquistas das últimas décadas serão absorvidas de forma sustentável em prol de uma vida melhor em nosso planeta.

Não significa necessariamente um desejo de retrocesso, mas, sim, um momento de ponderação sobre quais mudanças são realmente estruturais e sustentáveis e quais foram impulsionadas mais por “purposewashing” do que por convicção social genuína.

O que todos esses discursos têm em comum? Eles evidenciam que, após a euforia e o ativismo exacerbado, a sociedade invariavelmente entra em um período de reflexão. Este é o momento em que separamos o que é produtivo e relevante daquilo que foi apenas barulho. É assim que avançamos. Esse fenômeno não é novo. Podemos ver paralelos históricos em outras ondas de transformação social, como os direitos civis, nos anos 1960, ou as revoluções feministas das décadas seguintes. Sempre há um momento de resistência e questionamento antes que a sociedade absorva e normalize as mudanças essenciais.

Estamos caminhando, portanto, para a fase de consolidação. Em breve, colheremos os frutos desse processo, quando as conquistas legítimas e estruturais se estabelecerão de maneira definitiva. As empresas deixarão de adotar práticas de diversidade apenas para atender a pressões externas e arão a fazê-lo de maneira orgânica e estratégica. Os debates deixarão de ser polarizados entre extremos e encontrarão um equilíbrio mais pragmático.

A onda anti-woke não é o fim de um ciclo, mas a transição para um novo estágio. Aquilo que for essencial sobreviverá. O que foi apenas exagero ou reatividade será descartado. Esse é o verdadeiro teste de qualquer transformação social: sua capacidade de resistir ao tempo e se integrar à sociedade de forma madura. O futuro não será um retorno ao ado, mas um novo equilíbrio em que mudanças reais se consolidam e se tornam parte do tecido social. Esse é o curso natural de qualquer revolução cultural bem-sucedida. Seguimos otimistas!

 

*A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião do Observatório do Terceiro Setor

 

Sobre o autor: Alain S. Levi é Fundador e CEO da Motivare e autor do livro “Marketing sem blá blá blá: inspirações para a transformação cultural na era do propósito”


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