Festival ABCR 2021 aborda papel do trabalho em rede na pandemia
Em sua 2ª edição online, o Festival ABCR 2021 focou nas oportunidades de inovação em meio à pandemia, no trabalho em rede e nas parcerias público-privadas

Por: Mariana Lima
Em sua segunda edição online, o Festival ABCR 2021: ‘Conexões para mudar o mundo’ reuniu representantes da Sociedade Civil para refletir sobre o cenário da captação de recursos em meio à pandemia da Covid-19 e a importância do trabalho em rede para se conseguir alcançar as metas propostas.
Realizada entre 28 e 30 de junho, a 13ª edição do evento, que é organizado pela Associação de Captadores de Recursos (ABCR), vem abordando conteúdos ferramentais focados no desenho de estratégias para as organizações, como a mobilização de recursos no espaço digital, o papel da comunicação na captação e o impacto da pandemia no perfil do doador brasileiro.
Para a abertura do evento, o Festival trouxe o DJ e produtor cultural brasileiro Alok, fundador da associação sem fins lucrativos Instituto Alok, com atuação no Brasil, na Índia e em países do continente africano. O Instituto atua em prol do investimento social em organizações e projetos de combate à exclusão social e de geração de oportunidades.
Lançado no final de 2020, o Instituto destacou o nome de Alok no setor da filantropia após uma doação de 27 milhões para um fundo social e a realização da Live Natal Sem Fome, resultado do contato com as organizações que entraram como parceiras da iniciativa.
“Ao longo da minha vida fui descobrindo que, de alguma forma, queria colocar a minha arte como uma ferramenta para mudar o mundo. O Instituto é materialização desse desejo. Eu já estava conectado com questões ligadas a inclusão e desenvolvimento humano, fazendo muitas doações físicas para pontes emergenciais. Mas com o Instituto estruturo isso para potencializar organizações já existentes e inspirar uma nova geração a desenvolver um subconsciente coletivo doador”, conta Alok.
A atuação do DJ no cenário pandêmico exemplifica as potencialidades criadas no Terceiro Setor frente à pandemia da Covid-19 e o papel da mobilização social para fomentar novas iniciativas.
O papel das parcerias público-privadas
Na primeira plenária do evento, realizada no dia 28 de junho, o foco foi a Fábrica de Vacinas. A iniciativa apresenta um novo modelo de governança criado pela parceria entre Governo, Empresas e Sociedade Civil para a captação de recursos.
A captação de R$ 170 milhões possibilitou a construção da nova fábrica do Instituto Butantan para a produção dos insumos necessários da CoronaVac, a vacina chinesa contra a Covid-19, garantindo independência e aumento da capacidade produtiva.
Para Patrícia Loyala, diretora de Gestão e Investimento Social Corporativo da Comunitas, a prática da governança compartilhada e de apoio à istração pública teve seus processos acelerados na pandemia.
“A pandemia fortaleceu as parcerias público-privadas [PPPs], pois não teríamos condições de desenvolver qualquer iniciativa sem o apoio a causas comuns entre os setores. E, ao longo da pandemia, fomos respondendo às demandas em consonância com as políticas públicas. Até que chegamos ao entendimento de que sem a vacina não conseguiremos avançar. A governança que construímos permitirá a produção das matérias-primas das vacinas sem a dependência dos laboratórios internacionais”.
Para Luciana Nicola, superintendente de Relações Institucionais, Sustentabilidade e Negócios Inclusivos Itaú Unibanco – que está apoiando a iniciativa –, o investimento social privado precisa estar alinhado às possibilidades de legados.
“Observamos nessa parceria um ambiente de transparência e com a possibilidade de legado para futuras necessidades que vão além da pandemia. É um novo caminho para o investimento social privado. Dessa vez, o diferencial é que nos unimos para uma ação maior, movendo tantos recursos para equilibrar este tripé tão importante que é a aliança ente o poder público, privado e a sociedade civil”, argumenta.
Outro parceiro que participou da plenária foi Rodrigo Moccia, diretor de Relações Institucionais da AMBEV, que pontuou a importância do trabalho em rede.
“A vacina é a solução definitiva. Quando o Butantan começou a desenhar o projeto, já iniciamos a parceria ao colocar nossa equipe para auxiliar e refinar o modelo de governança para captar outros parceiros. Acreditamos no trabalho em rede e na capacidade de se trabalhar conectado com outras empresas para combater todos os problemas que afetam a sociedade”.
A questão do trabalho em rede também foi reforçada por Patrícia Loyala, da Comunitas. “Cada um dos atores trouxe as suas bases, experiências e possibilidades de ações. A governança é um acúmulo de experiência que conseguimos colocar na mesa e ter um diálogo aberto. Cada um colocando seu ativo na execução para a construção de algo melhor. É muito mais do que atingir a meta do setor”, defende.
Fomentar para potencializar
Olhando para as causas sociais, o trabalho em rede também possibilitou um melhor alcance de algumas iniciativas. Um dos exemplos é o Coletivo Unificados pela População em Situação de Rua, que reúne 49 projetos que atuam na região de Recife (PE) na defesa de quem vive nas ruas.
A iniciativa surgiu em 2016, em resposta à necessidade de descentralizar e estruturar de forma organizada a atuação dos projetos na região. Na pandemia, a iniciativa ganhou novos contornos.
“No início da pandemia, fizemos um levantamento com os projetos e percebemos que a maioria havia parado. Ninguém estava atuando nas ruas, mas não podia ser assim. Reunimos os coletivos para compartilhar recursos e voluntários de forma a manter a atuação. Era algo que isolados não estávamos conseguindo, mas quando nos juntamos se tornou viável”, revela Rafael Albuquerque Araújo, cofundador do Coletivo Unificados pela População em Situação de Rua e presidente da ONG Samaritanos.
Assim, o coletivo conseguiu uma parceria com o Armazém do Campo, uma loja do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) que, de março a outubro de 2020, cedeu o espaço para que o coletivo montasse uma cozinha solidária. A parceria permitiu a distribuição de 250 refeições por dia, 200 mil litros de água doados e 700 voluntários captados, além das entregas de marmitas em 9 rondas diárias por Olinda e arredores.
Com o fim da parceria no espaço, o coletivo migrou para o prédio do antigo Liceu de Artes e Ofícios da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP), que se tornou ponto de higienização para a população em situação de rua. No espaço, eles podem tomar banho, lavar a própria roupa e receber doações de alimentos e kits de higiene.
“O Coletivo Unificados traz uma credibilidade para os projetos. Agora, o prédio reúne diversos serviços que já eram oferecidos pelos projetos individualmente, como o atendimento jurídico e encaminhamento para o SUS, capacitação profissional, formações de cultura e artes. É um espaço colaborativo construído pela rede”.
Desde o início da pandemia, o Coletivo conseguiu captar R$ 500 mil, arrecadar 70 toneladas de alimentos, 2 mil cestas básicas e 80 mil litros de água mineral. Neste conjunto, foram 300 mil refeições distribuídas, 22,5 mil atendimentos no ponto de higienização e 18 mil kits de higiene.
Rafael reforça que o impacto alcançado não teria sido possível fora do trabalho em rede, mas ressalta que há desafios. “O principal desafio da rede é manter essa união entre diferentes grupos. É fundamental promover um compartilhamento que não negligencie os envolvidos. Fazemos reuniões quinzenais para que todos acompanhem o que está sendo feito e possam opinar nas decisões”.
Apesar da informação ser o principal ativo do trabalho em rede, Rafael argumenta que os recursos financeiros são o ponto mais sensível.
“Foi necessário um entendimento de que o Coletivo era o melhor. Montamos uma base comum de informações entre os projetos para que todos da captação tenham o. No Terceiro Setor, quanto mais pequena é a ONG mais escasso é o cenário de doação e parceiros. Então, ainda é difícil trabalhar a ideia de se compartilhar os recursos. Mas o Coletivo mostra o quanto podemos crescer ao trabalhar assim, contra o individualismo e a competição”.
Para Rafael, a pandemia pode potencializar esse modelo ao destacar as possibilidades das gestões colaborativas.
“Tivemos que experimentar o pior do individualismo na pandemia para entender que esse não era o caminho. Ninguém participa do coletivo se não entender que todos têm voz, vez e espaço. Assim, todos se percebem como partes dos ganhos e da organização. Essas redes têm força para atuar em nível nacional ao promover soluções coesas em diversos níveis para tratar problemas sociais de forma definitiva”, aponta.
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