Orçamento para combater violência contra a mulher piorou a cada ano
Em estudo inédito, Inesc apresenta balanço dos valores gastos nos últimos 4 anos da gestão Federal para combater a violência contra a mulher; a maior redução foi registrada em 2020, no auge da pandemia

Por Ana Clara Godoi
O Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) verificou em sua mais recente análise, uma mudança expressiva na gestão e financiamento das políticas públicas para as mulheres nos quatro anos de governo Bolsonaro, com consequências também para o ano de 2023. Tais mudanças foram feitas sem a participação da sociedade civil, deixando de fora a parcela mais afetada pelo tema – as próprias mulheres.
No Plano Plurianual (2020-2023), além das modificações na programação orçamentária, o governo oscilou, em seus quatro anos de duração, entre baixa alocação ou baixa execução dos recursos.
Um dos momentos mais críticos para as políticas públicas voltadas ao enfrentamento à violência contra a mulher foi o ano de 2020, auge da pandemia. O governo Federal deixou de gastar R$ 80,7 bilhões disponíveis para enfrentar as consequências do Sars-Cov-2. Milhares de mulheres poderiam ter sido atendidas com o auxílio emergencial, caso o governo tivesse executado todo o recurso autorizado.
O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) também deixou “sobrar” 70% dos recursos voltados para o enfrentamento da violência contra as mulheres no mesmo ano, apesar da suspensão das regras fiscais e da flexibilização das normas para contratos e licitações decorrentes do decreto de calamidade pública. Esse percentual correspondia à época a um montante de R$ 103,1 milhões (dado corrigido pela inflação), que não chegou aos estados e municípios para financiar a rede de atendimento às mulheres.
Em 2020, o Ministério só gastou 29,45% dos recursos autorizados (ver Tabela 1). Nos programas de Enfrentamento à Violência, Promoção da Igualdade e da Autonomia das Mulheres, por exemplo, os gastos de 2020 totalizaram R$ 38,2 milhões, valor 33% inferior aos de 2019. “Na ocasião, as mulheres, mais do que nunca, precisavam do apoio do Estado, uma vez que as condições de vida pioraram de um modo geral, e a violência doméstica aumentou quando muitas tiveram de fazer o isolamento social com seus agressores”, enfatiza trecho da nota técnica do Inesc, assinada pela assessora política da instituição, Carmela Zigoni.
O desfinanciamento das políticas públicas de enfrentamento à violência contra as mulheres foi piorando gradativamente, com o pior cenário apontando para o ano atual. No Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) 2023, a antiga gestão Federal enviou o pior orçamento para a pasta dos últimos anos: apenas R$ 13 milhões para as ações voltadas às mulheres. Houve, contudo, aumento do recurso autorizado no Congresso, chegando a R$ 33,1 milhões, valor ainda muito menor se comparado a anos anteriores. A diminuição de recursos alocados para as mulheres entre 2022 e 2023 foi de 24%, e poderia ter sido de 70%, se não fosse a ação do Legislativo.
Como recomendações para o atual governo Federal, o INESC cita a elaboração do capítulo das mulheres do PPA 2024-2027 de forma participativa; a garantia de um programa orçamentário específico para as mulheres, objetivando maior transparência dos recursos públicos; o aumento da alocação de recursos para políticas de enfrentamento à violência e de promoção da autonomia das mulheres, de modo a assegurar sua plena execução; e a implementação da Casa da Mulher Brasileira, com participação social, em todos os estados do Brasil. As ações contribuem para o ODS 16, meta da Agenda 2030 da ONU que promove o combate à violência.